domingo, 26 de agosto de 2012



"Enquanto os homens se contentaram com suas cabanas rústicas, enquanto se limitaram a costurar com espinhos ou com cerdas de suas roupas de peles, a enfeitar-se com plumas e conchas, a pintar o corpo com várias cores, a aperfeiçoar ou embelezar seus arcos e flechas, a cortar com pedras agudas alguns instrumentos grosseiros de música - em uma palavra: enquanto só se dedicaram a obras que um único homem podia criar, e às artes que não solicitavam o concurso de várias mãos, viveram tão livres, sadios, bons e felizes quanto o poderiam por sua natureza, e continuaram a gozar entre si das douçuras de um comércio independente; mas, desde o instante em que um homem sentiu necessidade do socorro de outro, desde que se ppercebeu ser útil a um só contar com provisões para dois, desapareceu a igualdade, introduziu-se a propriedade, o trabalho tornou-se necessário e as vastas florestas tranformaram-se em campos aprazíveis que impôs regar com o suor dos homens e nos quais logo se viu a escravidão e a miséria germinarem e crescerem com as colheitas." 

(Jean-Jacques Rousseau, Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens. In Os Pensadores, São Paulo, Editora Abril, s/d, vol. 6, p. 264-265, trad. de Lurdes Santos Machado.)